quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Quase uma quadrilha


Ele disse que me amava.
Disse que eu era a menininha dos olhos dele.
Fomos felizes durante alguns meses. Amei aquele cara até o dia em que por meio de algum motivo fútil, o destino separou. Quebrou, acabou.
Chorei litros de saudade, uma mistura de vazio e angustia. Desapareceu, desfez todos e quaisquer laços. Nunca mais soube de seu paradeiro.
Eis que surge um novo personagem me oferecendo a mão. Sorriso estrelado, voz de canção, prometendo curar o desgosto do passado. Por fim, não fiquei só com a mão, mas com o braço inteiro. Cumpriu com o combinado, tirou o desgosto do passado, limpou a mancha da facada, e na minha casa fez a sua morada.
E ele disse que me amava.
Disse que eu era a menininha dos olhos dele.
Nos fomos sim feliz por meses, alguns anos. Amei aquele cara até o dia em que descobri outra bolsa no carro dele, outra mensagem de “Boa tarde” após a minha, outra cor de batom. Outra personagem.
Será que ele tinha duas pupilas em um só olho? Só sei que nos olhos dele eu nunca mais brilhei.
Chorei litros de raiva. É, raiva, de ódio mesmo.
Ser trocada como uma peça de roupa que não serve mais ou como por um tomate mais maduro, dói. Dói muito, não só o cotovelo como também dói o coração.
Desde então me escondo no quarto quando algo parecido com o amor bate na porta. Não abro não.
Ouvi uma frase, dessas bem prontas, batidas mesmo, que diz: “podem me enganar uma vez, mas não duas” e novamente me senti o ser humano mais acéfalo do mundo. Quase uma ostra mesmo.
Raios.
Morreram eles no passado. Hoje me visitam uma vez no ano, assombram apenas no dia de seus aniversários que não consigo esquecer. Deveria esquecer, mas vem ano, vai ano e sempre lembro. Esqueço o numero da minha casa na hora do Express lanches, mas não esqueço essas malditas datas.
Todavia, o que quero mesmo contar é que por um descuido, uma desatenção, meio que acidente mesmo alguém entrou. Não, eu não abri a porta. Ele arrombou. Após essas duas tragédias mencionadas acima, deixei meu lado açucarado coberto pelo amargo. Apresentei a alguns meu lado monstro. No sentido concreto mesmo: devoradora de sentimentos alheios. Kinder-ovo sem surpresa, coco da Bahia oco. Acredite, consegui ser miss antipatia por muito tempo. Reflexo do passado, só.
Mas com esse foi inevitável. Lutei até o fim para que deixasse comigo somente o gosto da coca-cola e levasse o sabor do beijo. Quis tanto que ao me abraçar deixasse o cheiro do amaciante de roupas e jamais o perfume fresco que ele usa. Fechei meus olhos por diversas vezes para não correr o risco de que ele me dissesse um dia: “Você é a menininha dos meus olhos”. Quer saber, odeio essa frase.
O intrigante é que tenho plena consciência de que vou chorar litros, sei que pela terceira vez vou me enganar. Mesmo afirmando e reafirmando que tranco a porta e me escondo no quarto, quero mais é abrir.
Quero mais é me aconchegar nos seus braços que quando me laçam perco o chão.
Quero mesmo é quebrar o relógio e atravessar a madrugada rindo da sua risada e corrigindo sua fala enrolava. Quero uma mordida no queixo, um fio de cabelo seu no sofá da sala, uma tese inventada por nos, um retrato tirado de surpresa. Quero tudo, mas quero nada.
Do que valeria tudo isso se eu não mergulhasse nessas poças de incertezas que o futuro não mostra?
Já fui desprezada, já fui traída, mas isso não pode ser concreto que lacre a porta. A porta do meu coração que já esta entreaberta.
E por ultimo, mas não menos importante: não haveria texto se eu não me deixasse arriscar. Se eu simplesmente, não sofresse.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Algodão-doce ( Capítulo 01 )

Catarina cortou seus cabelos. Viajou sozinha para capital, não levou celular e nem malas. Rasgou o mapa que levava de volta pra casa.
Deixou para trás o formato dos pés.
Catarina havia levado uma mordida no coração. E tudo perderá o sentido desde então: as ruas da sua cidade descoloriram, as praças desmoronaram, as flores murcharam, carros parados, prédios, clubes, bares... todos os lugares invadidos por um fantasma. Por isso de abandonar, ir embora.
A menina mordida sozinha na capital. Catarina mergulhou em uma lagoa desconhecida e ainda com sangue no babado do vestido encontrou um homenzinho amarelo que lhe segurou a mão.
Homenzinho amarelo segurou a mão da menina sem coração.
Ele quis cura-lá com ervas. Banha-lá no mar. Quis perfuma-lá com a brisa fresca da aurora, cintilar seus olhos estrelados. Ele enfeitou os cabelos curtos de Catarina com pétalas de ternura.
O homenzinho amou a menina.
Catarina ganhou de presente um coração amarelo sem mordida. ( ...)

Pedaços

Aquele ali. Não olha agora, ele acabou de passar.
Não usa mais aquela camisa branca que lhe dei no natal de 2008. Não usa nem o escapulário que disse ter gostado tanto. Aquele seu aniversário foi uma festa.
Um milhão de fotos: diferentes cenários, caretas, beijos, abraços, risos. Onde colocar tantas recordações? Não caberia no caminhão de lixo e para não dar trabalho aos gáris, por isso e somente por isso, guardo tudo. Tudo.
As flores já estão secas mais ainda perfumam meu quarto. Sua foto ainda enfeita a moldura perfeita daquele porta-retrato.
No canto do guarda-roupa, a jaqueta preta que você se recusou pegar de volta. E sabe, a jaqueta tem vida. Seu cheiro está pregado nas costuras e as vezes passo horas sugando uma mistura de Malbec, tecido e saudade.
Hoje me recordo de você sem tristeza, sem desejar que sua namorada te traia com seu melhor amigo. Quer saber: eu nem a odeio mais, só ainda acho que o cabelo dela precisa de hidratação.
Desperdicei tanto tempo querendo te ver mau que acabei me amargurando sozinha.
Aí perdi a luta. No chão, último suspiro, você deu o nocaute final. Não é drama, saber que vocês foram viajar nas férias passadas foi literalmente o sôco que me derrotou.
Agora depois de tanto tempo percebi: estava lutando comigo mesma e você... você nem se lembra mais de mim.
E vou contar, na verdade nem me importo. É, me acostumei com seu desprezo sútil e discreto. Pareço invisivél aos seus olhos.
Quero mesmo é contar que guardei você junto com todos seus pedaços que ficavam espalhados no meu caminho. Tudo guardado.

Escudo de Cristal

Fui embora, você também foi.
Não deixou nenhum vestigío. Trocou telefone, mudou de endereço, amou outras pessoas.
Comigo não foi diferente, acesso outro email, trabalho em outro lugar, ganhei alguns quilos.
A cor da fonte do meu msn não é mais vermelha.
A sua não deve ser aquele amarelo-morto.
Mudaram os tempos, os ventos, as rotinas. Mudaram os sonhos.
As vezes esqueço seu rosto e depois lembro. Esqueço sua voz e esqueço mesmo, choro por não conseguir me lembrar. Sou um mosntro por não ser capaz de recordar a feição do meu escudo de cristal. Era assim, escudo de cristal, como eu lhe chamava.